Tratamentos

Câncer de Retroperitônio

Introdução

Os tumores de retroperitônio representam 0,2% de todas as neoplasias diagnosticadas atualmente. São tumores típicos da 4° a 6° décadas (podendo ocorrer em qualquer idade), com ligeiro predomínio masculino. Têm origem mesenquimal (vascular, muscular, tecido conectivo, tecido adiposo, tecido neural e remanecentes embriônicos), sendo que 1/3 dos tumores malignos originários do retroperitônio são sarcomas, e aproximadamente 15% dos sarcomas de partes moles originam-se no retroperitônio.

Estão associados a fatores de risco como radioterapia prévia (principalmente MFH [histiocitoma fibroso maligno], osteosarcoma e fibrosarcoma), trauma, exposição ao asbesto e herbicidas.

Os tumores de retroperitônio são malignos em 70-80% dos casos, sendo 50% de alto grau. Dentre as lesões benignas destacam-se o lipoma (mais comum), lipomatose pélvica, mielolipoma (geralmente na glândula adrenal), xantogranuloma (hoje subclassificado como MFH), leiomioma, ganglioneuroma, homangiopericitoma e schwanoma. Das lesões malignas temos o lipossarcoma (mais comum, podendo metastatizar) em 41% dos casos, leiomiossarcoma em 28%, MFH (cada vez mais comum por diagnóstico molecular) em 7% dos casos, fibrosarcoma (alto risco de metástases) em 6%, tumores malignos da bainha neural periférica em 3%, além de rabdomiosarcoma (significante em pediatria), hemangiopericitoma maligno, sarcoma de células sinoviais e angiossarcoma.

Clínica

Quando os tumores de retroperitônio são menores de 5cm, raramente são percebidos pelos pacientes, até que atinjam tamanhos maiores. Como manifestações clínicas, apresentam principalmente massa abdominal e perda de peso, dor abdominal vaga e difusa. O diagnóstico diferencial é com hematoma (geralmente associado à história de trauma ou anticoagulantes), abscessos (que cursam com febre, leucocitose) e metástase ou cistos (rim, pâncreas, adrenal). Deve-se descartar a presença de tumores funcionantes e não-funcionantes de adrenal (com provas funcionais), tumores renais, pancreáticos, gastrointestinais (com endoscopia digestiva), de células germinativas (com exame testicular e marcadores tumorais) e linfomas (com biópsia excisional). Uma história clínica e exame físico detalhados podem ajudar a distinguir tais enfermidades. Em lesões com grande probabilidade de serem sarcomas, o papel da biópsia guiada por tomografia computadorizada é controverso, porém deve ser biopsiado em caso de diagnóstico incidental durante laparotomia exploradora.

No diagnóstico, a tomografia computadorizada é o exame de escolha, embora a ressonância nuclear magnética e exames intestinais contrastados possam ser úteis. A biópsia é útil para descartar linfoma ou metástase e para orientar a terapia cirúrgica, baseada na histologia do tumor. O estadiamento conclui-se com exames laboratoriais e radiografia de tórax. Cintilografia óssea deve ser indicada em casos de dor óssea ou alterações laboratoriais.

Apresentam-se como doença metastática no momento do diagnóstico em 20% dos casos. Avaliação anatômica e funcional renal para avaliar o rim contralateral é fundamental, já que o tratamento pode exigir a ressecção renal em 32-46% dos casos para se conseguir margens negativas (seguido de cólon em 25%, adrenal em 18%, pâncreas em 15% e baço em 10% dos casos). Atualmente, 20-40% dos tumores são irressecáveis por completo.

No estadiamento, todas os tumores de retroperitônio devem ser considerados lesões profundas, entretanto têm cursos clínicos variáveis, dependendo de seu tipo histológico e grau. A raridade de tais tumores, combinada com uma vasta gama de tipos histológicos, tem complicado seu conhecimento e afetado o desenvolvimento de novas terapias. Possuem uma grande tendência de recidiva local (mesmo no pós-operatório precoce) e disseminação para outros órgãos abdominais (como fígado), apresentando também recorrência à distância (pulmonar em até 20-30% dos casos), com relatos de recorrência em 5 anos de até 80%.

Como fatores prognósticos, as margens cirúrgica, seguida pelo grau do tumor, são as variáveis mais importantes na sobrevida livre de doença. A sobrevida depende diretamente da ressecção completa (margens negativas) e do grau. Sobrevida livre de doença em 5 e 10 anos de 63-65% e 43-56%, respectivamente, com risco de recidiva local de 25-50%.

Lesões de Retroperitônio
(adaptado de Lahey e Eckerson [1934], e Ackerman [1954])
Tumores Tecido de Origem Tumor benigno Tumor maligno
Adiposo Lipoma Lipossarcoma
Músculo liso Leiomioma Leiomiossarcoma
Músculo estriado Rabdomioma Rabdomiossarcoma
Conectivo Fibroma Fibrossarcoma
Vascular linfático Hemangioma linfático Linfangiossarcoma
Vascular sangüíneo Hemangioma Angiossarcoma
Hemangiopericitoma
Mesenquima primitivo Mixoma Sarcoma de células claras (Mixossarcoma)
Histiócito Histiocitoma Histiocitoma Fibroso Maligno
Nervoso Bainha nervosa Neurofibroma não encapsulado Schwannoma maligno
SN Simpático Ganglioneuroma Ganglioneuroblastoma
Neuroblastoma
Cromafim e adrenocortical Paraganglioma Paraganglioma maligno
Feocromocitoma Feocromocitoma maligno
Incerto Mesenquimoma Mesenquimoma maligno
Xantogranuloma Xantogranuloma maligno
Restos embrionários Teratoma benigno Teratoma maligno
Cordoma benigno Cordoma maligno
Outras malignidades Tumor de células germinativas, primário ou metastático
Tumores indiferenciados ou metastáticos
Cistos Wolffianos (origem urogenital)
Quilosos (origem linfática)
Dermóides
Mesocólicos
Parasitários
Traumáticos
Massas não neoplásicas Abscessos
Hematomas
Fibrose retroperitoneal

 

Tipos Histológicos de Sarcomas de Partes Moles (segundo TNM 2004)
Sarcoma alveolar de partes moles
Sarcoma epitelióide
Condrossarcoma extra-esquelético
Osteossarcoma extra-esquelético
Sarcoma de Ewing extra-esquelético
Tumor neuroectodérmico primitivo (PNET)
Fibrossarcoma
Leiomiossarcoma
Lipossarcoma
Histiocitoma fibroso maligno
Hemangiopericitoma maligno
Mesenquimoma maligno
Tumor maligno da bainha de nervo periférico
Rabdomiossarcoma
Sarcoma sinovial
Sarcoma SOE (sem outra especificação)

Os seguintes tipos histológicos não são incluídos: sarcoma de Kaposi, dermatofibrossarcoma (protuberans), fibromatose (tumor desmóide) e sarcomas originados na duramater, cérebro, vísceras ocas ou órgãos parenquimatosos (com a exceção dos sarcomas de mama). O angiossarcoma, um sarcoma agressivo, é excluído porque sua história natural não é compatível com a classificação.

 Estadiamento TNM (2004) – Classificação Clínica
T TX O tumor primário não pode ser avaliado
T0 Não há evidência de tumor primário
T1 Tumor com 5 cm ou menos em sua maior dimensão
T1a Tumor superficial *
T1b Tumor profundo*
T2 Tumor com mais de 5 cm em sua maior dimensão
T2a Tumor superficial *
T2b Tumor profundo*
N NX Os linfonodos regionais não podem ser avaliados
N0 Ausência de metástase em linfonodos regionais
N1 Metástase em linfonodos regionais
M MX A presença de metástase à distância não pode ser avaliada
M0 Ausência de metástase à distância
M1 Metástase à distância

* O tumor superficial é localizado exclusivamente acima da fáscia superficial, sem invasão desta; o tumor profundo é localizado ou exclusivamente sob a fáscia superficial ou superficialmente à fascia, com invasão ou penetração total desta. Os sarcomas retroperitoneal, mediastinal e pélvico são classificados como tumores profundos.

Deve haver confirmação histológica da doença e a divisão dos casos por tipo e grau histológico.

Categorias T (exame físico e diagnóstico por imagem), N (exame físico e diagnóstico por imagem) e M (exame físico e diagnóstico por imagem).
Os linfonodos regionais são aqueles referentes à localização do tumor primário. O envolvimento de linfonodos regionais é raro e os casos nos quais a condição nodal não pode ser avaliada, clinica ou patologicamente, devem ser considerados N0 ao invés de NX ou pNX.

Na Classificação Patológica (pTNM), as categorias pT, pN e pM correspondem às categorias T, N e M.

Grupamento por Estádios
Estádio TNM
IA T1a N0-X M0 Baixo grau
T1b N0-X M0 Baixo grau
IB T2a N0-X M0 Baixo grau
T2b N0-X M0 Baixo grau
IIA T1a N0-X M0 Alto grau
T1b N0-X M0 Alto grau
IIB T2a N0-X M0 Alto grau
III T2b N0-X M0 Alto grau
IV Qualquer T N1 M0 Qualquer grau
Qualquer T Qualquer N M1 Qualquer grau

 

Graduação Histopatológica
Sistema de dois graus (TNM) Sistema de 3 graus Sistema de 4 graus
Baixo grau Grau 1 Grau 1
Grau 2
Alto grau Grau 2
Grau 3
Grau 3
Grau 4

Nota: Tumor neuroectodérmico primitivo (PNET) e sarcoma de Ewing extra-esquelético são classificados como de alto grau.

Tratamento

Se possível, o paciente deve ser visto por uma equipe mutidisciplinar. O objetivo desta estratégia é evitar ressecções maiores inapropriadas de outros tumores, como linfoma e tumores de células germinativas.

O tratamento é eminentemente cirúrgico, com ressecções extensas e com margens cirúrgicas amplas, mesmo que para isso seja necessária a ressecção de órgãos adjacentes, podendo ser seguido de radioterapia intraoperatória ou pós-operatória em casos de margens cirúrgicas insuficientes. Em alguns casos, indica-se radioterapia ou quimioterapia primárias, prévias à cirurgia. Em casos de recidivas operáveis, a terapia cirúrgica é indicada. Já nos casos de doenças irressecáveis ou tumores avançados, tratamentos paliativos como quimioterapia e/ou radioterapia estão indicados.

Seguimento

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Fontes:
Campbell-Walsh Urology, 10th edition (2011)
Comprehensive Textbook of Genitourinary Oncology, 4th edition (2011)
National Comprehensive Cancer Network (NCCN) Clinical Practice Guidelines in Oncology (NCCN Guidelines®) – Soft Tissue Sarcoma – Version 2.2014

Links úteis para pacientes:
Soft Tissue Sarcoma